segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

32 - A MOÇA MAIS BONITA, Do livro Do Miolo do Sertão. A História de Chico Rolim contada a Sebastião Moreira Duarte

A MOÇA MAIS BONITA
Do livro Do Miolo do Sertão
A História de Chico Rolim contada a Sebastião Moreira Duarte

pag. 89 a 91


Quando eu vi esta moça no casamento de Valdemar, no Melão, procurei dentro de mim onde já nos havíamos encontrado. Uma voz interior me falava que nós já nos tínhamos nos avistado antes, em algum lugar. E, sim, foi no Umari, no balcão da loja do Umari, que os nossos olhos se cruzaram pela primeira vez. Não sei por que ela visitava a vilazinha, nem posso dizer se foi aquele o olhar da primeira sedução. Uma coisa, porém, se ligou de logo à outra. No entra-e-sai dos afazeres preparatórios para a celebração nupcial e para os comes-e-bebes da festa a seguir, eu me censurava  por não identificar, à primeira vista, quem era aquela moça, bonita como quê!, a me cativar a atenção. E por que ela estava ali, na casa de minha mãe, íntima da família? Ah. Era irmã da minha noiva, a minha cunhada. Mas eu creio que, também nessa segunda vez, não tivemos temo um para o outro, o que é de lamentar.
Eis-me agora em Cajazeiras, em casa do meu irmão, morando com minha cunhada. Deus, que sempre faz as coisas certas e, afinal, é quem determina o roteiro da nossa de nossa existência pelo mundo, coloca-me de novo diante da moça. Com freqüência estamos os dois na mesma casa, ela visitando a irmão, eu hospedado com o meu irmão. Sentamo-nos os dois à mesma mesa e, desta vez, trocamos olhares que se encontram e se entendem. Chico e Teresa são que se pronunciam cada vez mais juntos. Teresa Augusta irá se chamar Tereza Augusta Rolim. O enxoval vai se aprontando. O velho Augusto Bernardino, que, além de meu sogro, vai se tornar um grande amigo e colaborador, também se esmera o quanto pode para conferir ao evento o toque da solenidade mais inesquecível. Mais uma vez o sítio Arara se movimenta para uma festa de se guardar na memória. Augusto Bernardino não deixa por menos. Na catedral da diocese de Cajazeiras, o Padre Linhares nos une pelo sagrado vínculo do matrimônio até que a morte nos separe. É o dia 31 de dezembro de 1950, assim escolhido também para nos abrir  para a mínima lua de mel, pois, a mim, já me esperavam tarefas inadiáveis do comércio e, à minha Teresa, a luta doméstica na casa nova que adquiri à Rua Siqueira Campos, também ela pintada na mais vida cor de tijolo queimado.
Última foto de mamãe com toda a família (1988). Em pé:
à esquerda a filha caçula Anacélia, no meio: a mais velha:
Anacleide e à direita: eu. Sentado: papai.

Muita coisa ou quase tudo desde então devo a Teresa, minha mulher, sustentáculo nas decisões mais duras e bálsamo para as dores e feridas inafastáveis. Sobretudo, devo a alegria de nonimar os filhos Anacleide, Claudiomar e Anacélia, que hoje vão premiando a nossa união com a presença sorridente dos netos. Ao lado deles, já celebramos as nossas bodas de prata matrimoniais e nos preparamos para fechar a casa dos quarenta anos de enlace matrimoniais e nos preparamos para fechar a casa dos quarentas anos de enlace amoroso, perante Deus e os homens. Os nossos retratos jovens na parede, gravados pelas mão mágica de Nogueira – esse mestre da arte fotográfica de que se orgulha a Cajazeiras de tantos mestres – continuam um diante do outro, em eterna atitude de namoro, confirmando que é assim a nossa vida e que a mim me coube a melhor parte dos Bernardino, a moça mais bonita, a amiga mais generosa, a irmã, a filha, a mãe mais dedicada.
Essas memórias são o que são porque, privilegiado, eu tenho Teresa Augusta Rolim a meu lado, segurando-me a mão, que Deus nos abençoe.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Visita a Chico Rolim, fiquei encantada com este homem!

       por Nadja Claudino - nadjaclaudino@yahoo.com.br
     Há livros que quando abertos não são apenas instrumentos de conhecimento, mas tornam-se instrumentos de sonhos e de grandes des-cobertas. 
   Um dia um desses livros caiu em meu poder: “Do miolo do sertão” era o título, o subtítulo dizia que era a história de Chico Rolim, ex-prefeito de Caja-zeiras. Peguei o livro e jul-guei antes de abrir, imaginei ser uma história banal de políticos, com obras e nomes disso e daquilo, mas ao abrir a primeira página me deparei com essa frase “os dias de tão bons, eram todos iguais”. Fui então à procura desses dias bons, e descobri um menino órfão e pobre, Francisco Matias Rolim. Quando me dei conta estava lendo a história com emoção, os so-nhos do menino de estudar, de ajudar a família me ca-tivaram. 
Sebastião Moreira Duarte e Chico Rolim
   Por meio da escrita poética de Sebastião Moreira Duarte, as tragédias, as aventu-ras, as anedotas e a determinação de Francisco me fizeram perceber que estava diante de um homem e de um livro extraor- dinários. Depois de algum tempo, quando estava pagando a disciplina de História da Paraíba, no curso de História do CFP, a professora Viviane Ceballos nos pediu que grupos fossem formados para a produção de documentários que serviriam como trabalho para a terceira nota. Me reuni com a amiga Gerlândia Gouveia e depois de pensarmos em diversos temas me lembrei de Chico Rolim, minha amiga topou e nós saímos tal como Glauber Rocha: “com uma câmera na mão e uma ideia na cabeça” a procura de nossa história. 
    
        Fizemos o contato com Chico Rolim, que nos recebeu em seu quarto, confortavelmente sentado em sua cama, pronto a responder as nossas perguntas. A simpatia desse homem não conhece limites, per-cebendo que estávamos um pouco nervosas, ele logo quebrou o gelo; necessitando de um lenço, olhou para mim e disse: “pegue aí no guarda roupa minha filha”, depois disso nos sentimos à vontade e a conversa fluiu durante uma manhã inteira. Falamos sobre sua vida de homem público e dos acontecimentos políticos no âmbito es-tadual e nacional que influenciaram seu governo. Re-lembrou Getúlio Vargas, o golpe militar de 1964 e nos surpreendeu ao lembrar as fortes palavras de Brizola em defesa de João Goulart. Nesse momento empostou a voz e disse que ouviu Brizola falar à meia noite, na Rádio Mayrink Veiga do Rio de Janeiro, a seguinte frase “Não darei o primeiro tiro, darei o segundo e até o último”. 
    Grande memória e lucidez. A conversa versou sobre tudo, sua vida comercial no Maranhão, as tragédias familiares, seu ingresso na política, as realizações, a modernização que trouxe a ci-dade de Cajazeiras eram relem-bradas por ele com um brilho no olhar, uma força na voz; a felicidade de compartilhar sua história estava estampada em seu rosto. Vendo esse homem de perto e conversando com ele percebi que Chico Rolim é daquele tipo de pessoa que realiza e que viveu em um tempo em que tudo precisava ser feito, por isso fundou escolas, comprou o terreno onde se localiza a UFCG, pavimentou ruas e lutou pelo engrandecimento da cidade que o tinha acolhido. Para minha surpresa me confidenciou que ainda hoje gosta de andar olhando as obras realizadas pela Prefeitura, mostrando assim a preocupação com o trabalho que começou, desejando sempre melhorias para a população de Cajazeiras. 
     Ao final da entrevista, eu e Gerlândia saímos felizes da casa de Chico Rolim, nossa ideia tinha dado certo, na câmera estava registrado o material bruto do nosso documentário, que contou também com entrevistas realizadas com o professor Rubimar Marques Galvão e com o comerciante Djalma Alves. Corremos para editar o vídeo e escolhemos como trilha sonora uma música de Belchior que diz: “eu era alegre, como um rio, um bicho, um bando de pardais, como um galo, quando havia, quando havia galos, noites e quintais...”, pois entendemos que Chico Rolim, com mais de noventa anos, lúcido e apaixonado por sua vida, sabe enfrentar as adversidades com alegria e escreve com trabalho e honestidade sua própria história. 

Nadja Claudino – contista, cronista e membro do conselho editorial da Revista Acauã. Aluna do Curso de História da UFCG/Cajazeiras.